#72 glifo por glifo ou a jornada do designer na escrita
parte 1: entrevistas com usuários + novidades!
hello, stranger! eu sou hele carmona; sou jornalista e estudante de design. essa newsletter está em hiato desde o início do ano porque estou trabalhando no meu tcc, conforme expliquei na última edição. em dezembro, me formo em Design na Esdi/Uerj. como trabalho final estou elaborando um workbook de escrita, desenvolvido com foco em designers e outros profissionais criativos. nessa edição vou contar detalhes dessa pesquisa e projeto que é muito especial pra mim :)
🫡 primeiro a obrigação, depois a diversão
Eu preciso admitir: estava ansiosíssima para diagramar um livro e dizer às pessoas o que fazer (brincadeira hehe). Mas esse ainda é um trabalho acadêmico, e eu precisei me dedicar à pesquisa primeiro. Depois da revisão bibliográfica, que compartilhei na edição passada, “Por que designers devem escrever?”, era hora de falar com gente de verdade. Ou como os UXers chamam, entrevistar meus usuários.
1. escolhendo um método
O meu objetivo é produzir um material para designers que ainda não escrevem (ou não se sentem seguros ao escrever), e no entanto, eu escrevo. Além da graduação em Jornalismo, só aqui na makers já foram mais de 70 textos publicados (e olha que eu não publico tudo o que escrevo, porque tenho bom senso, hehe). Não faço parte do meu público alvo. E daí?
Para conhecer melhor esse público — designers que não escrevem — decidi fazer entrevistas. No livro Research for Designers: A Guide to Methods and Practice (2016), Gjoko Muratovski define entrevista como
“um método que você pode usar para descobrir as ideias, opiniões e atitudes das pessoas. Existem diferentes tipos de entrevistas, mas, para fins de pesquisa, ‘entrevista’ pode ser definida como uma forma de conversa entre um pesquisador e um participante, geralmente guiada por uma sessão de perguntas formais.”
Escolhi conduzir entrevistas semi-estruturadas, uma vez que esse modelo segue uma pauta fixa, mas que contém algumas perguntas abertas, deixando o participante livre para responder de forma mais extensa. Ainda de acordo com Muratovski, a entrevista semi-estruturada fornece ao entrevistador a oportunidade de alcançar questões sobre as quais ainda não havia pensado:
“Frequentemente, você precisará fazer perguntas abertas e solicitar esclarecimentos conforme a entrevista avança, mas também precisa estar ciente de que a conversa pode facilmente se desviar. Por outro lado, deixar a conversa se desviar pode, às vezes, informá-lo sobre certos assuntos dos quais você não estava ciente anteriormente.”
A entrevista como método de pesquisa em design pode ser segmentada em quatro estágios: seleção de participantes, elaboração da pauta, realização das entrevistas e análise dos resultados. Meu referencial teórico para estruturar esses estágios foi o livro Interviewing Users: How to Uncover Compelling Insights, de Steve Portigal.
2. traçando objetivos
Antes de iniciar o processo de pesquisa com entrevistas, é essencial definir o que se quer aprender sobre os usuários. Para o meu trabalho, defini o seguinte:
O objetivo principal é entender por que alguns designers não escrevem; e mais especificamente:
Se eles têm interesse, necessidade ou oportunidades de escrever sobre design;
Quais dificuldades e limitações encontram ao escrever;
E o que poderia encorajá-los ou ajudá-los a escrever.
No capítulo 3, Getting Ready to Conduct Your Interviews, Steve Portigal discorre sobre o processo de recrutamento de participantes, e escreve que é útil analisar várias partes do processo que se deseja explorar (nesse caso, a escrita realizada por designers), afirmando que
“mesmo que estejamos projetando apenas uma parte da experiência, podemos obter uma compreensão mais profunda ao observá-la de múltiplos pontos de vista”
Sendo assim, optei por entrevistar um segundo grupo — designers que escrevem — com outros objetivos:
Entender por que eles escrevem; e mais especificamente:
Como surgiu seu interesse, necessidade ou oportunidade de escrever sobre design;
Quais dificuldades e limitações encontraram ao começar a escrever, e como puderam mitigá-las;
E o que os motiva a continuar escrevendo.
3. as entrevistas
Foram 15 entrevistas, que totalizam cerca de 375 minutos ou 6h25 no total. Para facilitar o tratamento das informações (já que era muita, muita informação), precisei seguir alguns passos: (1) transcrever as entrevistas assim que possível, para que as informações ainda estivessem frescas na minha mente; (2) marcar pontos relevantes — que respondem mais especificamente aos objetivos definidos — durante a transcrição; e (3) escrever um resumo em tópicos dos pontos mais relevantes da entrevista, criando uma espécie de “quadro resumo”. Essa terceira é de longe a dica mais útil que posso dar sobre entrevistas. Obrigada por tudo, graduação em Jornalismo 🩷
4. os resultados
Agrupei as informações coletadas separadas por tema, pensando em responder aos objetivos principais definidos previamente. Os temas foram motivos para escrever, motivos para não escrever, principais desafios para a prática da escrita, importância da escrita para a prática em Design, incentivo à escrita na formação em Design, sugestões de quem escreve e o que poderia encorajar a prática da escrita. Ufa.
E aqui vai o que eu achei mais interessante:
As motivações para não escrever sobre design mais citadas foram insegurança, medo de errar, falta de prática, falta de incentivo por parte do mercado, falta de tempo e bloqueio criativo.
Só que… enquanto designers que não costumam escrever tem medo de não saber o suficiente ou de escrever algo considerado incorreto, designers com uma prática de escrita estabelecida não sentem o contrário.
Eles não sentem que tudo o que escrevem está correto, mas que estão aprendendo e explorando teses com o processo de escrita em si.
O antídoto ao sentimento de insegurança não precisa ser a confiança plena, mas um deslocamento do objetivo: não acertar, mas aprender.
✏️ elaboração do workbook
Agora sim!! Hora de juntar tudo o que li, anotei, perguntei, transcrevi, etc etc. A elaboração do workbook pode ser dividida em duas partes: o conteúdo textual e a forma. Nesse e-mail só vou conseguir falar sobre o conteúdo textual — o projeto gráfico fica para a próxima edição, na semana que vem.
Glifo por glifo já está quase pronto, com 32 páginas que unem teoria e 9 exercícios práticos que convidam designers e criativos a explorar a escrita livre e autoral :)
Vou produzir 100 exemplares físicos artesanais. Se você tem interesse em adquirir o seu, preencha esse formulário que eu entro em contato com você com mais informações sobre o lançamento :)
Além das entrevistas, analisei alguns livros semelhantes ao meu projeto: (a) compostos por exercícios práticos (b) para designers ou outros profissionais criativos. Os títulos escolhidos foram Aprender de coração (2023), de Corita Kent; Exercices d'observation (2022), de Nicolas Nova; e Graphic Design Play Book (2019), de Aurélien Farina e Sophie Cure. O objetivo dessa análise foi identificar a natureza e a linguagem predominante nos exercícios.
O terceiro tipo de fonte foi a minha experiência pessoal com a escrita enquanto estudante e praticante de Design.
Qualquer guia de escrita é atravessado pela subjetividade do autor. Como escrever bem, publicado em 1976 por William Zinsser, é considerado um dos melhores e mais completos guias sobre escrita de não ficção. Apesar da linguagem objetiva, podemos identificar diversos pontos no livro em que a vida e o contexto pessoal de Zinsser aparecem. Em duas passagens ele desencoraja o uso de palavras derivadas do latim, considerando-as “mais complicadas” do que as de origem anglo-saxônica; isso acontece porque Zinsser escreve em inglês, e esse elemento de sua biografia molda sua percepção sobre a língua de forma diferente de um falante nativo de português, por exemplo. Ele também utiliza narrativas pessoais para introduzir suas instruções sobre escrita. Da mesma forma, Inspiring Writing in Art and Design – Taking a Line for a Write (2009) de Pat Francis e Writing For the Design Mind (2019) de Natalia Ilyin tem sua estrutura e linguagem marcadas pela prática pedagógica das duas autoras, que atuam como professoras de design.
É mais prudente e transparente admitir que minha subjetividade e meus valores em relação à escrita, ao Design e à educação serão incorporados ao meu workbook do que tentar ignorá-los ;)
Eu estou na reta final do trabalho, fechando os últimos detalhes do projeto gráfico e impressão dos livros. Espero você na semana que vem por aqui pra ler sobre isso também <3
como sempre, obrigada por ler até aqui. fique a vontade para responder esse e-mail ou comentar na edição — espero que esse possa sempre ser um espaço de troca. se você ficou interessado em adquirir um exemplar de Glifo por Glifo, não deixe de preencher esse formulário, ok? como são poucas unidades, vou priorizar quem sinalizar interesse, enviando o link da pré-venda um dia antes pra quem preencher o forms. e se você conhece alguém que pode curtir esse texto, que tal compartilhar essa edição? :)
Que delicia de edição! Vou preencher o cadastro pq quero muito ler sua pesquisa 🌸 parabéns!