#18 brazilcore vs. bolsocore
então você tem medo de torcer pro Brasil e acabar sendo confundido com um bolsominion? | tempo de leitura: 6 minutos
hoje já aviso que a edição está mais leve e um pouco mais… opinativa. o tema é copa, porque eu também quero pão e circo às vezes - quem não gosta, né? mas, se a gente vai se ater ao design, vamos lá, vamos falar de semiótica. quem estuda comunicação visual sabe que nenhuma estética é vazia: podemos depreender significados de todo lugar, inclusive da moda e dos jeitos de se vestir. e bom… com uma observação um pouco mais acurada e comprometida, é possível classificar looks do Brasil em um gráfico de alinhamento político. não acredita? eu te provo. a estrela da edição de hoje é essa análise, mas vou compartilhar também algumas leituras interessantes a respeito do “brazilcore”. vamos?
🤝Marina Martins: cursando estudos de mídia na uff e sempre online. grande entusiasta de moda, cultura, entretenimento e arte.
a Marina sugeriu o tema dessa edição e participou do processo de pesquisa & escrita desse texto. Se você curtir o conteúdo, pode se conectar com a Marina através do LinkedIn.
🇧🇷 para começar do começo
Afinal, o que é brazilcore? Spoiler: não é o mesmo que bolsocore
Se você perguntar ao Google, provavelmente vai ler que brazilcore é uma tendência ou estética de moda que pretende valorizar o Brasil e os elementos nacionais, como as cores, a bandeira, a camisa da seleção, etc. Será mesmo?
Você já ouviu alguém dizer que está com medo de torcer para o Brasil na Copa e ser confundido com um apoiador do atual presidente?
Considerando a capacidade humana e social de extrair significados de símbolos visuais, brazilcore não é apenas usar roupas e acessórios do Brasil, mas também justamente se opor ao uso partidarizado desses elementos. Então, se você ainda não entendeu o que é brazilcore e o que não é, eu fiz um gráfico pra te ajudar.
Posicione o seu look com base na semelhança com as fotos escolhidas e saiba quanta chance você tem de ser confundido com um ***********.
Fiz esse gráfico com base no famoso Political Compass, originalmente dividido entre esquerda e direita econômica, autoritário ou liberal. Entre brazilcore e bolsocore, dá pra ver que alguns padrões se repetem: brazilcore é simples, despretensioso e fashionista. Bolsocore é mais elaborado, dá pra notar que tenta ser refinado, mas não consegue chegar lá. Resumindo, quanto mais elaborado/forçado, mais bolsocore (e menos brazilcore), hahah. Mas se seu look estiver pendendo mais para a direita, não precisa entrar em crise: esse gráfico não reflete necessariamente a posição política de quem veste o look, e sim a maior probabilidade de interpretação.
❤️ para se inspirar
Abacaxi e a loja Piña
Se eu tivesse que escolher só um estilista pra falar de brazilcore seria o Jeanderson Martins, mais conhecido como Abacaxi, o criador da loja Piña.
A marca junta a estética dos anos 2000 com brazilcore em uma nostalgia perfeita - afinal, o penta veio em 2002 grande parte dos brasileiros guarda memórias da época com muito carinho. Mas além disso, o que chama atenção no trabalho do Abacaxi é o seu comprometimento em valorizar suas origens, a favela e a moda que nasce ali. Nesse ano a Piña produziu um desfile em vagões de trens da SuperVia, no Rio de Janeiro - uma escolha muito original e simbólica, já que o transporte público é um espaço ocupado em sua maioria pela classe trabalhadora. A mensagem de Abacaxi é clara: seu trabalho pode ganhar o mundo, mas ele também é feito para a favela. Essa matéria conta essa história com mais detalhes, além de trazer vídeos e fotos do desfile icônico.
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💭 para refletir
2 artigos sobre a gentrificação estética do brazilcore
Brazilcore: a tendência de moda que sempre esteve nas ruas da minha casa, por Mayra Souza para o Steal the Look
“Apesar do termo ter sido criado só agora e o assunto estar mais quente do que nunca, as camisas da seleção brasileira, nossa bandeira e cores e toda a estética do futebol sempre foram valorizadas e sempre estiveram no mais alto nível de ostentação nas favelas e periferias brasileiras, inclusive onde eu cresci, no Capão Redondo, na Zona Sul da Cidade de São Paulo. Todo esse background faz a ascensão do Brazilcore agridoce para mim. (…) Me questiono:
Por que as camisas da seleção e os outros símbolos do futebol só são considerados estilosos e fashionistas quando vistos em pessoas brancas e padrões? E quando visto em pretos e periféricos é brega?”
A polêmica por trás da estética que faz camiseta do Brasil de tendência, por Taya Nicaccio para a Capricho
“Apesar de ser precursora de muitas febres que consumimos hoje, como aquelas que fazem referências aos anos 2000, mais conhecidas como Y2K, o surgimento de novas tendências nunca é direcionado para as periferias.
Quando isso acontece, é sempre em uma posição subalterna, vista como inferior e feia, pelo menos quando se tratam de corpos racializados e periféricos vestindo. Mas, do contrário, é lindo e maravilhoso, como as tranças em pessoas brancas.”
Essas duas análises apontam para um argumento comum: embora o brazilcore possa ter crescido por conta da copa e do momento político e social do país, ele existe há muito tempo. O que mudou, essencialmente, é que ele saiu da periferia - mas isso não garante o protagonismo dos precursores dessa tendência.
Gentrificação é o fenômeno que afeta uma região ou bairro pela alteração das dinâmicas da composição do local, tal como novos pontos comerciais ou construção de novos edifícios, valorizando a região e afetando a população de baixa renda local. Tal valorização é seguida de um aumento de custos de bens e serviços, dificultando a permanência de antigos moradores de renda insuficiente para sua manutenção no local cuja realidade foi alterada.
Esse é um conceito da geografia, mas dá pra aplicar aqui: uma estética característica de áreas de baixa renda é apropriada por pessoas de classes mais ricas, e é exaltada - aí se torna um objeto de desejo geral. Mas os novos produtos que surgem dentro dessa estética são caros e acabam sendo inacessíveis para aqueles que originalmente mantinham aquela espécie de tradição. E, infelizmente, a gente vê isso acontecer o tempo todo. Vale a pena ler os textos e ficar atento!
obrigada por chegar até aqui! e aí, seu look de copa corre risco de ser confundido com o de um b*ls*m*ni*n? e o que você pensa sobre a gentrificação do brazilcore? fique a vontade para responder esse e-mail se tiver algum comentário ou sugestão. espero que esse possa sempre ser um espaço de troca.
até a próxima terça!
- hele
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👩🏻💻 curadoria e textos por hele carmona, jornalista & estudante de design
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nossa eu amei essa edição, hele! parabens de coraçao e amo marina minha amiga pessoal tddebom! bjss
nossa essa edição ficou muito boa!